Praticar exercício é um hábito saudável, mas em tempos de distanciamento social e maior dificuldade para manter uma rotina de atividades físicas, a preocupação com a boa forma pode não estar sendo benéfica à saúde mental da população. Esta é uma das conclusões a que chegaram pesquisadores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), da Universidade Federal do Ceará (UFCE) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), que se uniram para realizar a pesquisa on-line “Efeitos da atividade física e do exercício sobre o bem-estar no contexto da pandemia de Covid-19”, entre os dias 31 de março e 02 de abril.
O estudo nacional ouviu 592 pessoas de todas as regiões do país e de quase todos os estados. Para participar, era preciso ter mais de 18 anos e estar em isolamento social por pelo menos uma semana. Entre os respondentes, 63% são mulheres e 37% são homens.
De acordo com Alberto Filgueiras, professor do Instituto de Psicologia da Uerj e coordenador do Laboratório de Neuropsicologia Cognitiva e Esportiva (LaNCE), o objetivo da pesquisa era verificar se a prática de exercícios estava de fato sendo algo positivo durante o confinamento.
– Os indivíduos sedentários que passaram a se exercitar só agora na quarentena apresentaram piores níveis de bem-estar emocional (22%) do que os que sempre fizeram atividade. Da mesma forma, aqueles que já praticavam exercício regularmente mas aumentaram a intensidade dessas atividades também tiveram baixos índices de bem-estar emocional (26%) – afirma Filgueiras.
Para ele, o que fica claro é a importância de não se alterar drasticamente a rotina e os hábitos de antes da quarentena, pois essa mudança gera mais ansiedade e, consequentemente, mais adoecimento mental. Outro ponto importante é a necessidade de se recorrer à ajuda de profissionais especializados para a prática das atividades físicas. Um dado que chama a atenção é a procura por aplicativos e vídeos no YouTube para a realização de exercícios.
Antes da pandemia, apenas 4% dos pesquisados faziam uso desses recursos na hora de se exercitar. Agora, em isolamento social, 60% recorreram às ferramentas tecnológicas. Para Filgueiras, o tratamento não individualizado oferecido pelos aplicativos contribui para os baixos níveis de bem-estar apresentados por esses grupos.
– Da mesma forma que muita gente recorreu a atendimento psicológico on-line, seria fundamental também que as pessoas enxergassem que praticar exercício é bom para a saúde, mas é preciso um olhar mais direcionado ao seu perfil e às suas necessidades, principalmente nesse momento – ressalta o professor.
Conforme o estudo, a mudança no estilo das atividades também impactou negativamente o nível de bem-estar mental em geral. Antes da pandemia, 27% das pessoas mantinham atividades ao ar livre e, depois, apenas 3%. Os exercícios praticados antes da quarentena que envolviam contato físico, como esportes coletivos, academias e natação, foram substituídos por treino de força, que passou de 5,2% para 13,9%, e treinamento funcional, que aumentou de 4,4% para 49,3%.
– Quem manteve o mesmo estilo de atividade foi menos impactado negativamente, reforçando mais uma vez que a quarentena não é o momento para se fazer mudanças abruptas no estilo de vida – conclui Filgueiras.