A peça “Gota D’Água {Preta}”, montagem do premiado ator, diretor e
dramaturgo Jé Oliveira, fundador do Coletivo Negro, de São Paulo,
estreia no Rio de Janeiro dia 16 de outubro. O espetáculo, que fica em
cartaz no Sesc Ginástico até 27 de outubro, é uma versão contemporânea
de “Gota D’Água: Uma Tragédia Brasileira”, escrita por Chico Buarque e
Paulo Pontes em 1975, e conta com um elenco formado predominantemente
por artistas negros. A obra mostra a versatilidade de Jé Oliveira ao
transitar entre o Rap e a MPB, já que seu último trabalho, a peça-show
“Farinha com Açúcar”, que rodou o país por três anos, homenageou os
Racionais MC’s.
O espetáculo recebeu indicações em três importantes prêmios nacionais:
APCA (Melhor Direção e Espetáculo), Shell (Inovaçao) e Aplauso Brasil
(Melhor Espetáculo Musical e Melhor Atriz Coadjuvante). Inspirado na
tragédia “Medeia”, de Eurípedes, “Gota D’Água {Preta}” traz como
personagem principal Joana, mulher madura, sofrida, moradora de um
conjunto habitacional. Jasão, seu ex-marido, é um jovem vigoroso,
sambista que desponta para o sucesso com a composição da canção que dá
nome à peça. Agora ele é noivo de Alma, filha de Creonte, corruptor
por excelência e o detentor do poder econômico e das casas, a Vila do
Meio-dia, local onde antes morou com Joana e os filhos. Se em “Medeia”
havia reis e feiticeiros, na tragédia brasileira “Gota D’Água {Preta}”
há pobres e macumbeiros, além de um coro negro, em alusão ao grego.
De modo inédito na história do teatro brasileiro Joana, interpretada
pela cantora e atriz Juçara Marçal (Metá Metá), e Jasão, vivido por Jé
Oliveira, são negros. A escolha política-estética do diretor traz a
força da musicalidade ancestral e a influência das religiões de matriz
africana.
“É como se estivéssemos realizando a coerência que a peça sempre pediu
e até hoje não foi realizada”, destaca Jé Oliveira. “A personagem é
pobre e é da Umbanda. Tudo leva a crer, pelo contexto histórico,
social e racial do país, que essa personagem é preta. Estamos
realizando o que a peça insinua. Estamos de fato enegrecendo a obra de
Chico Buarque e concretizando o que ele propõe.”
A montagem não busca apenas uma reparação histórica para diminuir um
hiato sobre a presença negra em papéis relevantes na dramaturgia
nacional, mas sobretudo, propõe uma re-atualização, com base na
coerência, ainda não realizada por nenhuma montagem, do clássico drama
brasiliano.
“Estamos discutindo traição de classe e de raça”, diz Jé, citando a
metáfora da traição conjugal. “Ele troca Joana por uma mulher mais
nova, então discutimos também o feminismo. Jasão também é preto e com
ele debatemos a ascensão social e a legitimidade ética disso.”
Para Juçara, Joana representa a mulher oprimida desde a formação do
Brasil. O grito oprimido desta camada da sociedade. As relações
humanas servem de pretexto para questionar essas posições sociais,
como se cada um de representasse um lugar, um grupo. “Ela é a mulher
que foi violentada, agredida. A pessoa sem voz que quer se vingar e
não sabe como”, explica a atriz.
“Quando o Jé resolveu montar ‘Gota D’Água’ mais preta a proposta foi
trazer o universo da periferia para a cena. Com os acentos, não só os
percussivos, mas os da cultura de periferia mesmo”, aponta o músico
Fernando Alabê.
O sagrado também está presente na música. “Com pessoas da comunidade
negra é natural que as religiões de matriz africana estejam presentes.
Tem canto de candomblé, de umbanda e o jongo – dança de roda de origem
africana com acompanhamento de tambores – serve de base. Tentamos
trazer para a peça a maneira que o negro entende sua divindade”,
realça Juçara.
O diretor musical William Guedes propôs uma instrumentação de saxofone
somada a DJ, percussão, guitarra, violão e cavaco. “Com isso, temos
uma estrutura musical que desfolcloriza a musicalidade de periferia, a
musicalidade negra, que é o cerne desta peça”, observa Alabê.
O cenário também traz a representação da religiosidade afro-brasileira
na concepção do artista Julio Dojczar, do coletivo casadalapa. Painéis
simbolizando os Orixás e elementos de cena como a imagem de Ogum / São
Jorge compõem o palco que remonta o período setentista em uma montagem
que, assim como a encenação, busca a percepção do todo pela parte. As
representações não são realistas mas induzem a criação imagética do
espaço de cena.
Além de Jé Oliveira e Juçara Marçal a montagem traz ainda em cena a
atriz, diretora e dançarina Aysha Nascimento (Coletivo Negro), a atriz
e MC Dani Nega, a atriz e bailarina Marina Esteves, o ator Mateus
Sousa, o ator, diretor e artista-educador Ícaro Rodrigues, o ator e
diretor Rodrigo Mercadante (Cia do Tijolo) e o ator, dramaturgo e
professor Salloma Salomão.
A direção musical é de William Guedes, da Cia. do Tijolo, e a música
é executada ao vivo por DJ Tano, do Záfrica Brasil, nas pick-ups,
Fernando Alabê na percussão, Suka Figueiredo no saxofone e Gabriel
Longuitano na guitarra, violão, cavaco e voz. O cenário é assinado por
Julio Dojczar, da casadalapa, e a luz é um projeto do light designer
Camilo Bonfanti. O design de som é de Eder Bobb e Felipe Malta. Eder
Lopes assina os figurinos e a assistência de direção. A produção é de
Janaína Grasso.
Serviço:
Peça ‘Gota D’Água (Preta)’
Quando – de 16 até 27 de outubro, de quarta a sexta às 19h e sábado e
domingo às 17h
Onde – Sesc Ginástico – Rua Graça Aranha 187 – Centro do Rio
Classificação – 14 anos
Duração – 3h40 min – inclui intervalo de 10 minutos entre os atos.
Ingressos – R$ 30 – R$ 15 e R$7,50 (Cartão Sesc)
Informações – 2279.4027
Ficha Técnica
Texto e Dramaturgia – Chico Buarque e Paulo Pontes.
Direção Geral, concepção e idealização – Jé Oliveira
Elenco – Aysha Nascimento, Ícaro Rodrigues, Jé Oliveira, Juçara
Marçal, Marina Esteves, Martinha Soares, Mateus Sousa, Rodrigo
Mercadante e Salloma Salomão.
Banda – DJ Tano (pickups e bases ), Fernando Alabê (percussão),
Gabriel Longhitano (guitarra, violão, cavaco e voz) e Suka Figueiredo
(sax).
Assistência de Direção e Figurino – Éder Lopes
Direção Musical – Jé Oliveira e William Guedes
Preparação Vocal – William Guedes
Concepção Musical e Seleção de Citações – Jé Oliveira
Cenário – Julio Dojcsar –
Montador de Cenário – Ulisses Barbosa
Artista Gráfico – Murilo Thaveira
Light Design – Camilo Bonfanti
Operação de Luz – Camilo Bonfabti, Leansdro Justino e Lucas Gonçalves
Técnico de Som e Operação – Alex Oliveira
Assessoria de Imprensa – Elcio Silva
Coordenação de estudos teóricos – Juçara Marçal, Jé Oliveira, Salloma
Salomão e Walter Garcia
Produção Executiva – Janaína Grasso
Produção Geral – Jé Oliveira
Fotos – Evandro Macedo
Vídeo e Edição – Marília Lino
Realização – Itaú Cultural
Produção – Gira pro Sol Produções